DA DITADURA NOS LEMBRAMOS
COM NOJO E INDIGNAÇÃO
Por Wanderley Rosa Matos
XVIII CELEBRAÇÃO DOS
MÁRTIRES
O evento é organizado pela Diocese
de Barra, via Paroquia de Nossa Senhora de Brotas, de Brotas de Macaúbas,
Paroquia de São João Batista, de Ipupiara, Paroquia de Nossa Senhora das
Oliveira de Oliveira dos Brejinhos e a Paroquia de Nossa Senhora da Piedade, de
Cocal – Brotas de Macaúbas. Nesta celebração, mais uma vez, serão homenageados,
os Mártires da Diocese de Barra, ou seja, pessoas que dedicaram sua vida por
uma causa justa e morreram defendendo uma vida digna para todos. Da luta pela reforma agrária, são homenageados, Josael de Lima o Jota, que morreu na cidade de
Barra, assassinado por grileiros e Manoel Dias de Muquém do São Francisco,
também morto por grileiros. Da luta contra a Ditadura Militar, nos anos 70, são
homenageados o Professor Luiz Antônio Santa Barbara, Otoniel Campos Barreto,
assassinados em Buriti Cristalino e o Capitão Carlos Lamarca e José Campos
Barreto, o “Zequinha” assassinados em Pintada.
A CELEBRAÇÃO
Esta 18ª Celebração
dos Mártires, acontece dia 17 de setembro de 2018, a partir das 15:00 h., na
comunidade de Pintada, no município de Ipupiara, onde está localizado o
Santuário aos Mártires da Diocese de Barra, construído no local exato onde
tombaram o Capitão Carlos Lamarca e Zequinha Barreto.
No Memorial chama a atenção
e conduz a uma reflexão os bustos em homenagem aos mártires, especialmente a
estátua de Zequinha Barreto carregando Carlos Lamarca, retratando uma passagem
da dolorosa perseguição aos revolucionários, conforme relatou populares da
comunidades de Carnaúba, quando Lamarca teria pedido a Zequinha que ele lhe
deixasse ali e fosse embora, fugisse da repressão, ao que o Amigo respondeu: “Amigo na Vida Amigo na Morte” e segui em frente carregando o companheiro que
se encontrava enfermo e já sem condições de caminhar.
EXPOSIÇÃO FOTOGRÁFICA
Também ficará aberta
uma mostra de fotografia organizada por Wanderley Rosa Matos, com fotografias
que revelam a passagem de Carlos Lamarca por Buriti Cristalino, como é o caso
da Barraca armada no acampamento de Buriti Cristalino, objetos pessoas como
Sandálias, sapatos e chapéus, fotografias que compõem o Relatório da Operação
Pajussara, bem como fotos do Jornal Tribuna da Bahia, onde aparecem o pé de
Baraúna que serviu de ultimo abrigo, a pedra que serviu de travesseiro e o
embornal onde carregavam alimentos,
fotos da casa dos Barreto em Buriti Cristalino, pertencentes a Fundação
Zequinha Barreto, além de fotografias dos quatro mártires, vitimas do Regime
Militar.
CARTA DE LAMARCA AOS FILHOS
Quando estava na clandestinidade
Lamarca escreveu uma carta para seus filhos, veja a seguir:
Aos Meus Filhos
Vivo falando de vocês com meus
companheiros, eles estão longe dos filhos também e falam nos filhos deles. Um
só é o desejo de todos nós, é que nossos filhos sejam revolucionários. O que é
um revolucionário? È toda a pessoa que ama todos os povos, ama a Humanidade,
tem uma imensa capacidade de amar, ama a justiça, a Igualdade. Mas ele tem de
odiar também, odiar os que impedem que o revolucionário ame, porque é uma
necessidade amar. Odiar aos que odeiam o povo, a Humanidade, a Justiça social.
Odiar aos que dominam e exploram o povo, odiar aos que corrompem, ameaçam e
alienam as mentes, aos que degradam a Humanidade, aos injustos, falsos,
demagogos, covardes.
O revolucionário ama a Paz, faz a
guerra como instrumento para ter a Paz, a Paz justa, sem exploração do homem
pelo homem. O revolucionário tem que ser capaz de todos os sacrifícios pela
causa, de até se separar dos seus filhos para libertar todos os filhos, de se
separar dos pais porque outros pais precisam dele. Quando vocês sentirem
saudades de mim, lembrem-se que aqui no Brasil existem muitas crianças que
passam fome, que andam descalças, sem escolas, que sofrem e veem deus pais
sofrerem. Lembram-se quando conversei com vocês no quarto e pedi a vocês que
deixassem eu lutar para acabar com isso. Eu lembro bem que a Claudinha bateu
palmas e o Cesar disse: "Muito bem, papai". Combinamos que tínhamos
de ficar longe um do outro, e que guardaríamos no coração a esperança de nos
encontrarmos novamente.
Vocês são felizes porque a mãe e o
pai são revolucionários e vocês têm de ser também. Amem muito a mamãe, eu não
posso beijá-la, todos os dias beijem duas vezes a ela, uma vez por mim. Tenho
tantas saudades de vocês, mas não choro, não beijo fotografias, encho o peito
de ar e pego firme no meu trabalho. Penso em vocês e em todas as crianças,
então ganho forças para lutar. Quando sentirem saudades, então estudem mais,
perguntem tudo que não entenderem, perguntem sempre o porquê das coisas -
perguntar e pensar - ver se é certo, se não for, falem, discutam - ver se é
justo, se não for, lutem para mudar. Sejam disciplinados, façam somente o que
for certo, justo. Ser disciplinado não é ser obediente, quem obedece tudo sem
pensar não presta.
Como vai o treinamento de tiro?
Não se esqueçam de colocar algodão no ouvido, e também de olhar sempre pra mira
e puxar o gatilho bem devagar. Já mandaram consertar a pistola de ar
comprimido? Espero que pratiquem corrida, natação e todos os jogos. Alimente-se
bem, vocês que tanto gostam de frutas devem estar satisfeitos, aí ninguém passa
fome, não tem mendigos, aqui... Aí comem abacate na salada, com sal e azeite;
gostaram?
Como vai o jogo de botão? Você,
Cesar, tem ensinado aos meninos? Seguem junto 29 bolinhas de cortiça, que fiz
treinando a paciência, que eu tinha pouco, é preciso ser paciente, sem ser
passivo, claro.
E você Claudinha, continua fazendo
discursos? Como eu gostava, você vai ser uma grande agitadora.
Cuidem bem dos dentes para que
possam mastigar bem. Não se esqueçam de cantar e dançar. O Cesar gosta muito de
desenhar e a Claudia de pintar, procurem praticar bastante, procurem criar, não
imitem ninguém.
Não chamem ninguém de senhor
porque ninguém é senhor de ninguém. Mas ouçam os mais velhos e procurem fazer
coisas melhor que eles, porque tudo que é novo é superior ao velho. Respeitem
os mais velhos mas exijam que respeitem vocês - exijam mesmo.
Contei para os companheiros que o
Cesinha usava nome de guerra e eles acharam engraçado. Já usei o nome Cesar mas
tive de mudar.
Não sei como acabar essa carta
porque é como se estivesse conversando com vocês. Espero receber uma carta de
vocês, se não for possível, continuarei pensando muito em vocês.
A maior alegria que vocês podem me
dar é aproveitar muito o estudo, preparando-se para fazer a Revolução em
qualquer país. Muitos beijos para a minha esposa querida e meus filhos, com
todo amor, cheio de saudades.
Ousar Lutar Ousar Vencer.
Carlos Lamarca
Mortos pela ditadura Militar em Brotas / Ipuipara
Texto: Wanderley
Rosa Matos
Fotos: Operação
Pajussara, Tribuna da Bahia, Fundação Zequinha Barreto,
Wanderley Rosa Matos, Cartaz do Filme de Buriti a Pintada (Reizinho).
Wanderley Rosa Matos, Cartaz do Filme de Buriti a Pintada (Reizinho).
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